No trecho musical mais conhecido sobre o Rio de Janeiro, Fernanda Abreu retrata uma “cidade da beleza e do caos”. A beleza é um cenário conhecido mundialmente. O caos chegou ao seu ápice em 2020. O Rio, hoje, enfrenta uma pandemia, uma crise econômica, política e existencial. O carioca sempre naturalizou situações difíceis e as absorveu, é parte da sua vida não se abater. Mas a irresponsabilidade política poucas vezes influenciou tanto na rotina da cidade.
Foto: Site Jovem Pan
De acordo com os números oficiais publicados no dia 17/06 (quarta-feira), o estado do Rio de Janeiro chegou aos 8 mil mortos por Covid-19. A capital é a cidade mais afetada e com mais da metade deste número, passando das 5 mil vidas perdidas para o vírus. Hoje, 18/06, chegamos à 90 dias da quarentena sem fim, graças ao jeitinho carioca de ser. Regras a serem seguidas? Que nada. Fiscalização devida? Pra quem? Consciência? Jamais. E, ah, o que de fato é mais importante: praia, shoppings e futebol.
A flexibilização feita pela Prefeitura do Rio de Janeiro seria uma medida gradual, mas se tornou um relaxamento sem limites do que já foi extremamente difícil de conquistar. Em um final de semana atípico de outono, o sol brilhou na capital fluminense e as praias encheram (inclusive com jogadores do Flamengo). Está liberado? Sim, com ressalvas. Mas o carioca não lê ressalvas. Os shoppings foram reabertos, com regras. Mas o carioca não segue regras. E hoje retorna o futebol, para fechar a tríade.
O futebol carioca trava uma verdadeira guerra da forma mais desnecessária possível, ou seja, uma guerra política. E engana-se, e muito, quem pensa que esses dois não se misturam. Ô, se misturam! Temos hoje uma batalha que tem de um lado FERJ (Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro), Flamengo, Vasco e os clubes menores do Rio e, do outro lado, Botafogo e Fluminense. Uma discussão que deveria ser saudável e consensual se tornou, nos últimos dias, palco para farpas e acusações, escancarando a baixaria que estamos. Botafogo e Fluminense defendem o óbvio: o não retorno nem mesmo dos treinamentos em grupo. Ambos os clubes mantém seus jogadores com treinamentos orientados para serem feitos em casa. Flamengo e Vasco fizeram exames e, apesar de testes positivos, estão treinando normalmente na zona oeste carioca. Isso mesmo com a morte de Jorginho, massagista rubronegro. Faz-se uma nota de pesar e até uma homenagem e, para o Flamengo, está tudo certo.
Foto: Alexandre Vidal/CR Flamengo
Para além de expor jogadores, comissões técnicas, funcionários dos clubes e do Estádio Maracanã, o jogo de hoje entre Flamengo e Bangu mostram o quão fundo estamos nesse poço. A partida, que retoma o futebol na segunda cidade mais afetada pelo Covid-19 no país será realizada – pasmem! – ao lado do hospital de campanha contra a doença. Para além da irresponsabilidade de tirar todas essas pessoas do seu isolamento – e, óbvio, todos estão isolados em ambientes diferentes -, o futebol passa o recado completamente equivocado que está tudo bem. Não está, Rodolfo Landim. Não está, Rubens Lopes. Não está, Alexandre Campello. Não está tudo bem, RIO!
Por Rayssa Rocha, colunista do Botafogo-RJ
Fontes dos dados:
Site oficial Governo do Estado do Rio de Janeiro
Site G1: