Dois pesos e duas medidas para a Supercopa
No dia 13 de fevereiro, vivi um dos dias mais insanos da minha vida. Saí cedo de casa, enfrentei ansiosa todo o caminho de Embu das Artes até Itaquera para acompanhar a final da Supercopa do Brasil de Futebol Feminino, entre Corinthians e Grêmio. Um rolê de mais de duas horas só na ida, mas, acreditem, valeu a pena e eu faria tudo de novo.
Desci em Arthur Alvim, onde encontrei minha parceira Vic Monteiro, que também ignorou as inúmeras baldeações pelas estações de São Paulo para acompanhar as Brabas, e juntas fomos à Neo Química Arena. Era o segundo jogo com ingresso pago e o público marcou presença. Ao longo do caminho, a felicidade de ver tantas famílias presentes, tantas mulheres, tantos torcedores com as camisas das jogadoras era imensurável. Mais de 19 mil Fiéis foram empurrar nossas guerreiras rumo a mais uma conquista.
Era 10h30, um sol escaldante. Jogo duro; início de temporada. As minas que foram perfeitas em 2021, conquistando do Paulista a América, buscavam uma Supercopa, que em teoria era sua por direito. Antes da final, as alvinegras atropelaram as arquirrivais Palestrinas, em Itaquera, já com boa presença da torcida: mais de 13 mil torcedores, público que muito time dito “grande” não leva ao estádio. Depois, com tranquilidade, as comandadas de Arthur Elias souberam passar pelas meninas do Real Brasília, credenciando-se assim à final diante das gremistas.
Sofremos por mais de 90 minutos, cantando, rezando, enfrentando a catimba do time adversário, que por vezes abdicou de jogar. Aos 48′ do segundo tempo, “a moda da casa”, Gabi Zanotti, a quem carrego devoção e admiração, resolveu testar os corações alvinegros, marcando o gol do título.
Sentei incrédula, tremia e só conseguia pensar: essas minas são fodas! Depois tudo foi festa, camarote, breja, festa com a taça, fotos com as guerreiras que lutaram por mais esse título. E a emoção de conhecer a Gabi frente a frente? Hajaaaa coração!
De lá pra cá, cada dia é um dejavú da festa, do que vivi com cada atleta. Mas nem tudo são rosas, principalmente diante da desigualdade com a final da Supercopa do Brasil Masculina, da qual não poderia me calar.
A Supercopa Feminina foi um sucesso de audiência, batendo cerca de 46 milhões de telespectadores assistindo pelo grupo Globo. Além disso, o Corinthians faturou quase 800 mil reais com bilheteria em dois jogos. Porém, não recebeu nenhum vintém da CBF. A entidade máxima do futebol se limitou a confeccionar 50 medalhas, a taça para as finalistas e mais nada. Ou seja, sem bonificação e sem prêmio. Sobrou a revolta das atletas.
O torneio teve patrocínio e mesmo assim nada. Aliás, teve uma esmola de 5 mil reais para o visitante e 10 mil para o mandante por partida como “ajuda de custo”. Enquanto isso, na competição masculina, somente o vice-campeão faturou nada mais, nada menos, que 2 milhões de reais, sem contar o carro no valor de 150 mil entregue ao melhor jogador da competição. Dá para acreditar?
Estamos falando de uma competição profissional, que recebeu apoio da torcida, mas não teve respaldo da própria entidade que a criou. Sim, a competição criada pela CBF exemplifica bem o machismo estrutural que compõe a sociedade brasileira e, pior, segue desvalorizando o futebol feminino.
Vivemos em uma sociedade marcada pela desigualdade de gênero. Por longos anos, as mulheres foram proibidas de jogar futebol sob a alegação absurda de que o esporte “era incompatível com seus corpos”. Foram mais de 40 anos de um decreto absurdo, mas também de resistência.
Preconceito e discriminação são rotineiros, enquanto milhares de meninas lutam para seguir com a bola nos pés, fazendo o que amam. A carreira é árdua, firmar-se nela é duro. A desvalorização é diária. Não é de hoje que nossas meninas se indignam, cobram melhores salários, bonificações, afinal, os prêmios do futebol feminino chegam a ser 113 vezes menores que os do masculino. No entrando, a certeza é que elas não estão mais a sós, agora a Fiel está junto, comprou a briga!
por Mariana Alves
*Esclarecemos que os textos trazidos nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do Portal Mulheres em Campo.