A partida válida pela 2ª rodada da fase de grupos foi cancelada
Morte de torcedores, invasão de campo e caos generalizado nas ruas de Santiago. Muita gente ainda teima em falar de maneira romantizada a respeito do que acontece durante as competições da Conmebol, mas isso só destaca a irresponsabilidade da entidade e mancha ainda mais a história do futebol Sul-Americano.
A partida entre Colo-Colo e Fortaleza, válida pela 2ª rodada da fase de grupos da Libertadores, realizada no Estádio Monumental David Arellano, em Santiago do Chile, já se desenhava para um clima hostil desde o sorteio da competição. Mas quem de fora poderia imaginar que o clima entre ambas as torcidas é ruim desde 2022? Explicando aqui para dar texto ao contexto.

Caso Lucero
Em sua primeira participação na Libertadores, em 2022, o Fortaleza enfrentou o Colo-Colo como mandante e perdeu por 2×1, com Juan Martín Lucero marcado para a equipe chilena. Na volta, o Leão venceu por 4×3 na casa dos adversários, se classificando para as oitavas de final. No ano seguinte, o Tricolor do Pici anuncia a contratação do atacante argentino, porém, os impasses do acordo milionário fez com que o Colo-Colo acionasse a FIFA contra o Leão do Pici.
A equipe chilena alegou que o clube brasileiro teria induzido o centroavante a rescindir contrato com sua antiga equipe. Caso a acusação fosse confirmada, o Fortaleza poderia ser punido com até um ano de proibição para contratar jogadores, com Lucero correndo o risco de ter sido suspenso pelo mesmo período.
Em janeiro deste ano, o Leão do Pici anunciou a decisão final da Corte Arbitral do Esporte (CAS) sobre o caso envolvendo os times e o atacante Juan Martín Lucero. A Corte, que é a instância máxima da justiça esportiva mundial, reconheceu que tanto o Fortaleza quanto o jogador agiram de forma regular no processo de rescisão contratual com a equipe chilena e o time cearense foi absolvido.
Com tudo isso de pano de fundo, o clima entre as torcidas ficou totalmente hostil. Com o sorteio da fase de grupos da Libertadores 2025 com ambas as equipes caindo no Grupo E, já sabíamos que o jogo poderia ser tenso. Mas ninguém contava que isso não seria nada comparado ao despreparo dos Carabineros (Polícia Chilena), do lado de fora e dentro do estádio, que, infelizmente, acabou ceifando a vida de dois torcedores do Colo-Colo.
Torcidas antes do jogo
O jornal chileno La Tercera noticiou que um grupo de torcedores tentou invadir o estádio, o que provocou uma grande confusão. A polícia foi acionada e, durante a operação, um veículo que lançava gás lacrimogêneo teria atropelado duas pessoas. Segundo a publicação, as vítimas fatais foram uma jovem de 18 anos e um adolescente de 13. Além disso, outros dez torcedores foram presos.
Dentro do estádio, torcedores do Fortaleza relataram que a torcida local tentou invadir o lado da torcida visitante por cima dos alambrados. Nem a polícia, nem os seguranças das empresas privadas agiram para conter os hinchas do Colo-Colo, que, segundo relatos, estavam com balaclavas para dificultar sua identificação.
Crise em ambos os time
E o que já era ruim poderia piorar ainda mais. O Fortaleza enfrenta uma crise de campo e de bastidores. Após demissão de dois diretores, o clima entre torcida e diretoria ficou ainda mais fragilizado. Já o clube chileno passa por uma crise no ano de seu centenário, o que gerou uma atmosfera extremamente desagradável para a partida desta quinta-feira (10).
No campo, o jogo foi tranquilo, contrariando o espírito das arquibancadas. A torcida local passou boa parte do primeiro tempo atirando objetos nos jogadores do Fortaleza (isqueiros, copos, moedas e até garrafas de whisky). A partida estava em 0x0 quando pôde-se ver a bateria da Barra-Brava Garra Blanca deixando o estádio aos 20’ da segunda etapa.
Poucos minutos depois, a torcida que estava atrás do gol norte começou a quebrar os vidros da divisória do alambrado e invadiu o campo. Os jogadores do Fortaleza rapidamente deixaram o campo.

A polícia local não interviu e mais torcedores invadiram o campo. O que se viu nessa triste noite foi a inércia das autoridades, tanto militares como da Conmebol. Barras de ferro foram atiradas no gramado, confusão generalizada nos arredores do estádio e, minutos seguintes, os veículos confirmaram que a confusão foi causada devido a torcida do Colo-Colo ter tido conhecimento dos óbitos antes da partida.
O jogo foi suspenso momentaneamente e nenhuma das equipes quis voltar a campo. Mesmo sabendo da MORTE de dois torcedores, o insensível do delegado da Conmebol quis finalizar a partida mesmo diante do cenário de total caos. Apenas na madrugada desta sexta-feira (11), no horário de Brasília, ainda 23h em Santiago, a entidade informou o cancelamento do jogo.
Saída do estádio
A torcida do Fortaleza, por segurança, saiu do Monumental David Arellano sem escolta policial, por incrível que pareça. Em nota, a Barra-Brava Garra Blanca prometeu vingança contra os Carabinero e, pelo que se sabe, a confusão continuou nos arredores do estádio. Segundo a Conmebol, o caso será encaminhado aos Órgãos Judiciais da Confederação para novas deliberações.
Fica claro aqui o caos que são as competições realizadas pela Conmebol com sanções e punições por sinalizadores, mas insensibilidade diante da morte de torcedores. Como assim voltar a partida? Junta-se a isso a total inércia do policiamento local dentro do estádio, mas sua completa hostilidade do lado de fora tirando a vida de dois jovens. Não há como terminar essa crônica sem um lamento. É de um pesar sem fim pensar que isso é tido como “folclore” do futebol sul-americano.
Por Sara Cordeiro
*Esclarecemos que os textos trazidos nesta coluna não refletem necessariamente a opinião do Portal Mulheres em Campo.