MEMÓRIAS RECENTES DE UM DIA HISTÓRICO DO FUTEBOL


(Foto: CBF)

Na década de 30, o Grande Circo Irmãos Queirolo, que resiste até hoje nos arredores de Curitiba, apresentou a um Rio de Janeiro bastante diferente do que hoje conhecemos, o Futebol Feminino. Porém, a atração se assemelhava muito mais a um número excêntrico e cômico, do que esportivo propriamente dito.

Vale lembrar que em 1930 aconteceu a primeira Copa do Mundo de Futebol organizada pela FIFA, no Uruguai, na qual a seleção brasileira se fez presente. Também nesta época, a categoria masculina, já bastante popular no país, dava os seus primeiros passos rumo à profissionalização, enquanto que a feminina era equiparada a uma atração de circo.

Voltando ao Circo Irmãos Queirolo, na primeira apresentação do Futebol Feminino as mulheres usaram camisas das Seleções do Uruguai e do Brasil, e o “número de futebol” foi um tremendo sucesso. Nas sessões circenses que se seguiram, foi organizado algo semelhante a um torneio, sendo que a cada disputa eram utilizados os escudos de times tradicionais brasileiros.

Um dos famosos cartazes que contam a história do Futebol Feminino no Brasil mostra que, em uma das apresentações, no terceiro ato da “colossal funcção dividida em 3 partes”, as “moças” representaram os times do Curityba FC e do Athletico Paranaense.

Foto: Acervo Museu do Futebol

Quem imaginaria que quase um século depois, mulheres trajadas com a camisa do Athletico Paranaense entrariam no palco para o ato principal de um colossal espetáculo, diante de um respeitável público de 28.447 pessoas?!

Neste sábado (10), Athletico e Ceará, duas tradicionais equipes do futebol brasileiro escreveram em suas histórias mais um capítulo: jogaram diante de 28.447 pessoas.

Desta vez, porém, a apresentação não se deu no palco do circo, mas em campo, numa das mais tradicionais Arenas de futebol do país e da América Latina. Também não houve a equiparação a um número circense, mas o que estava em disputa era a primeira partida da grande final de um Campeonato Nacional oficial.

A entrada das 22 jogadoras e das 4 integrantes da equipe da arbitragem não aconteceu depois de palhaços – com todo respeito à arte da palhaçaria – nem de acrobatas, equilibristas ou domadores. Elas foram a atração principal.

E como atração principal empolgaram os torcedores presentes como se deve: cânticos, palmas, gritos de apoio e admiração. As Gurias Furacão conquistaram a Arena e, com gols de Milena e Sol, saíram na frente na disputa de 180 minutos em busca do título da competição nacional da série A2.

Há quem diga que a pressão da torcida abalou as jogadoras do Vozão. As Gurias, por outro lado, jogaram como se fosse mais um dia normal de treino. Utilizaram a força e voz dos atleticanos como aliados, e deixaram o palco principal gigantes, ostentando uma importante vitória por 2 a 0.

Nunca na história do Campeonato Brasileiro Feminino, em ambas as séries, uma equipe se apresentou diante de tantos torcedores. O Corinthians tem o recorde de público no Brasil, é verdade, porém a partida era pelo Paulistão, oportunidade na qual colocou em sua Arena 30.077 pessoas. Nos EUA, país onde a categoria feminina é valorizada e difundida há bastante tempo, o recorde é de 27.248 torcedores, em jogo que aconteceu entre OL Reign e Portland Thorns, pela NWSL em 2021.

Cahuê Miranda / Athletico

Não bastasse a marca histórica conquistada pelo Athletico havia um sentimento a mais envolvido na partida. Há algum tempo, torcedores vêm sofrendo com a chamada elitização do futebol que afastou o povão do estádio. Para a partida das Gurias, o Athletico disponibilizou entradas gratuitas, condicionando-as à entrega de 1 kilo de alimento não perecível, que foram destinados à instituições de caridade, possibilitando à famílias inteiras, que sequer conheciam a Arena pós Copa do Mundo de 2014, sentir novamente, ou pela primeira vez, a emoção de estar nas arquibancadas do Joaquim Américo.

Mais que uma categoria, o futebol feminino mostra a cada dia que é, sem dúvidas, uma ideia. E como ideia baliza uma causa de muitas que lutaram, que quebraram muros e barreiras, se entregaram, se doaram e ainda o fazem. Às mulheres que um dia sonharam que o sol do futebol feminino poderia um dia brilhar, muito obrigada. Falta muito, mas algo sugere que estamos encontrando a luz do caminho certo.

Por Daiane Luz

*Esclarecemos que os textos trazidos nesta coluna, não representam, necessariamente, a opinião do Portal Mulheres em Campo


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