Estádio completa 104 anos em 2021
A CASA DO REI DA AMAZÔNIA
Estádio Evandro Almeida ou, simplesmente, Baenão. Fundado em 15 de agosto de 1917 e com capacidade para pouco mais de 13 mil torcedores, essa é a casa do Clube do Remo no Campeonato Brasileiro da Série B de 2021. Localizado no encontro da Travessa Antônio Baena com a Avenida Almirante Barroso, o Baenão se impõe dentre prédios residenciais e comércios locais, atraindo azulinos dos quatro cantos da cidade.
Esse texto poderia ser em torno de grandes jogos e acontecimentos no estádio, poderia ser sobre a vez que o Rei Pelé pisou no gramado azulino, ou sobre quando Eusébio, o “Pérola Negra”, jogou aqui. Poderia ser sobre o RexPa vencido pelo Leão por 5 a 2, em frente a mais de 33 mil torcedores na época – o maior público da história do Baenão, em partida válida pela antiga Taça Ouro. Entretanto, tudo isso não faria sentido algum.
Falar do Baenão é falar do Fenômeno Azul, é falar de amor ao Clube, de saudade, de esperança, mas também é falar de má gestão, falta de cuidado, falta de respeito. As narrativas sobre a casa azulina não conseguem fugir dessa realidade, e também não escondem o fato de que se estamos de volta à nossa casa hoje é graças a torcida que um dia jurou nunca abandonar o time e, indo muito além dessa promessa, fez da sua missão tornar possível o Retorno do Rei ao Baenão.
O PESADELO
Quando Amaro Klautau assumiu a presidência do Remo em 2009, o clube tinha uma dívida trabalhista de mais de R$10 milhões. Por conta disso, o Mais Querido viu sua casa ser ameaçada com a possibilidade de tombamento da área do Baenão, para que a venda suprisse esse valor. Então, na madrugada de 23 de agosto de 2010, um dos episódios mais revoltantes aconteceu: o escudo do Remo, que ficava talhado no pórtico histórico do estádio, foi derrubado à marretadas e substituído por outro. A intenção era que isso invalidasse o tombamento do espaço, mas o episódio gerou revolta entre os torcedores e marcou o início da destruição do estádio.
Em 2013, a presidência foi assumida por Zeca Pirão que chegou com um plano de modernização do estádio. Os alambrados foram derrubados, além de um dos setores de arquibancadas e cadeiras. Então, em maio de 2014, veio o que foi o último jogo do Remo em casa por muito tempo. O Leão recebeu o Independente e venceu por 4 a 0, na frente de aproximadamente 10 mil torcedores que viram o estádio com alambrados de vidros temperados e gramado novo. Parecia estar dando tudo certo.
Entretanto, o Remo não voltou mais a jogar em casa naquele ano. Até que em 2015, Pedro Minowa, presidente eleito, disse aquilo que todos os azulinos temiam: o Baenão não tinha mais condições de receber jogos de futebol. O gramado e os alambrados de vidros temperados eram inferiores ao que se esperava e já ofereciam riscos. O golpe final veio na análise sobre as arquibancadas do tobogã: a estrutura havia sido completamente comprometida e inviabilizava qualquer plano de voltar a jogar no local.
RETORNO DO REI AO BAENÃO
Foi aí que o Fenômeno Azul entrou para mudar o destino da própria casa. No dia 15 de maio de 2017, um grupo de torcedores lançou um projeto chamado “O Retorno do Rei ao Baenão”, que visava justamente tornar possível que o clube voltasse a jogar em seus domínios.
Foram muitas as campanhas comandadas por parte do projeto para a arrecadação de fundos para as obras. Em todos os jogos no Mangueirão, era possível ver pessoas com a camisa do projeto vendendo, de artigos do clube, a bebidas alcoólicas. Toda renda e movimentação era repassada aos torcedores através de uma espécie de “Portal da Transparência” do projeto.
Em 2019, já com Fábio Bentes na presidência e com a diretoria participando mais ativamente das ações para arrecadar renda destinada ao estádio, a diretoria azulina confirmou uma data para voltar a jogar em casa. Entretanto, para isso, um último esforço era necessário por parte da torcida: comprar todos os ingressos que começaram a ser vendidos meses antes da data do jogo.
Foi então que um azulino em especial chamou atenção. Seu João Luiz, com 63 anos na época, empurrou uma bicicleta cargueira por mais de 8km para fazer a doação de uma saca de cimento para o clube do coração. Segundo ele, isso era tudo o que ele poderia oferecer para ajudar na causa.
“Eu tomei conhecimento através da televisão que estavam arrecadando doações para ajudar na reconstrução do Baenão. Foi então que eu fiquei pensando em ajudar de alguma forma, mas não tinha condições. Eu queria fazer parte dessa reforma. Foi então que juntei um dinheiro e decidi comprar um saco de cimento. Coloquei na minha bicicleta e fui empurrando até o Baenão, já que era muito pesado e eu não conseguia pedalar. Desde então, incentivo outras pessoas a doar, nem que seja um pouco”, disse ele.
Mesmo sem o dinheiro do ingresso, seu João conseguiu garantir presença no estádio ao ganhar o ingresso de um outro azulino, o DJ Paulo Melo, que viu a notícia, ficou comovido com a história e doou o próprio ingresso, já que não poderia ir ao jogo.
“Eu não teria condições de ir ao jogo, pois o preço está alto, mas tive a sorte de receber o ingresso. Será um dia especial para todos nós que torcemos pelo Remo. O Baenão me traz à memória lembranças de quando vi Alcino, Bira, Dadinho jogando”, disse seu João.
Então, no dia 13 de julho de 2019, era hora de voltar para casa. Eu lembro de ir, poucas horas antes do jogo, até a sede social para tentar comprar um ingresso, mas não consegui. Estava tudo esgotado. Passei de carro pelos arredores do estádio e ainda consigo escutar a torcida em êxtase do lado de fora. Ainda faltavam boas horas para o duelo contra o Luverdense-MT pela Série C, mas o Fenômeno Azul, com saudades de casa, chegou antes para recepcionar aqueles que teriam a honra de vestir o manto azul marinho naquela tarde de sábado.
Dentro de campo, quase veio um balde de água fria. O time azulino saiu perdendo por 2 a 0 e só nos acréscimos do segundo tempo conseguiu o empate com gol de Eduardo Ramos. A torcida foi à loucura. Não era justo que no reencontro fôssemos derrotados. E não fomos. Estávamos em casa outra vez.
BANPARÁ BAENÃO
Já reaberto e recebendo jogos pela parte da tarde, a Toca do Leão passou por mais uma mudança no final de 2020. Em acordo com o Governo do Estado, os naming rights do estádio foram negociados por 2 anos e o mesmo passou a se chamar Banpará Baenão. A negociação ocorreu na reta final da Série C, que deu o acesso azulino à segunda divisão do Campeonato Brasileiro. Com o valor do acordo, a diretoria azulina comprou os novos refletores que foram instalados e permitiram ao clube voltar a mandar jogos noturnos dentro de casa.
O caminho foi longo, difícil e muitas vezes triste. No entanto, voltamos para casa e daqui não pretendemos mais sair. Que o futuro guarde bons anos e momentos dentro da nossa casa e que as futuras gestões honrem o filho da glória e do triunfo.
*Esclarecemos que os textos trazidos nesta coluna não refletem, necessariamente, a opinião do Portal Mulheres em Campo.